Anistia para o 8 de janeiro e a greve da PM no ES: paralelos e lições
Há quem tema que anistiar seja visto como fraqueza, podendo incentivar novos atos disruptivos. Contudo, o exemplo do Espírito Santo sugere o contrário. Artigo do advogado Gabriel Quintão Coimbra, publicado neste dia 05/05 no jornal A Gazeta.
A proposta de anistia humanitária para os manifestantes do 8 de janeiro é diretamente comparável à anistia concedida aos policiais militares grevistas no Espírito Santo em 2019. Ambos os eventos geraram crises graves que abalaram a ordem pública, exigindo respostas que equilibrassem justiça, pacificação social e pragmatismo.
A greve dos PMs no Espírito Santo durou semanas e teve efeitos devastadores: mais de 200 mortes, um salto na criminalidade e perdas econômicas de R$ 180 milhões.
Apesar disso, o governador Casagrande (PSB) optou por anistiar as sanções administrativas de mais de 2.600 policiais, revertendo expulsões e evitando punições em massa. A medida, aprovada pela Assembléia Legislativa, foi justificada como essencial para restaurar a confiança social, priorizando a pacificação sobre a rigidez punitiva. Não se tratou de matéria penal (crimes), pois somente a União pode legislar sobre o tema. Contudo, o cerne do debate é idêntico.
08 de janeiro viu manifestantes contestando os resultados das eleições de 2022. Uma minoria vandalizou as instituições, causando danos estimados em mais de R$ 14 milhões. A resposta inicial do governo e do Judiciário, liderada pelo ministro Alexandre de Moraes, foi marcada por excessos: prisões prolongadas, ausência de devido processo legal e violações aos direitos humanos. Um caso emblemático, entre muitos, foi o de uma mãe condenada a 14 anos pelo crime de "golpe de Estado", apenas por pintar de batom a frase "perdeu, mané" (dita pelo Presidente do STF) na estátua da Justiça.
Sem histórico de violência ou processos, essa mãe ficou dois anos em prisão preventiva e teve negada a prisão domiciliar, apesar de ter filhos menores - um tratamento desigual em relação a outros casos, como o da esposa do ex-governador Sérgio Cabral, que recebeu o beneficio.
Na reação ao 8 de janeiro, não passam despercebidos os abusos do STF e contradições com seus próprios precedentes (jurisprudência). De um lado, a Corte anula condenações da Lava Jato (mudando seu entendimento conforme os ventos políticos, mais uma vez) e dá prisão domiciliar para o deputado acusado de matar a combativa vereadora Marielle Franco por decisão de Moraes (aceitando alegações de saúde). De outro lado, um preso do 8 de janeiro morreu de infarto em detenção, mesmo com parecer favorável da PGR por sua soltura pelo mesmo motivo de saúde.
Essa contradição alimenta o debate sobre a anistia.
A proposta para o 8 de janeiro busca separar os responsáveis diretos pelos atos violentos dos manifestantes pacíficos, evitando punições generalizadas. Assim como no Espírito Santo, onde a maioria dos PMs grevistas apenas reivindicava melhores condições de trabalho, poucos dos milhares presentes em Brasília participaram da depredação. A anistia é defendida commo um instrumento de reconciliação, capaz de encerrar a crise sem sobrecarregar o Judiciário com processos controversos.
Há quem tema que anistiar seja visto como fraqueza, podendo incentivar novos atos disruptivos. Contudo, o exemplo do Espírito Santo sugere o contrário: a moderação, a humildade e a sabedoria dos líderes restauraram a paz, evitando um ciclo de tensões. No caso do 8 de janeiro, a anistia poderia seguir o mesmo caminho, desde que os responsáveis pelos danos sejam devidamente punidos.
Ambos os eventos mostram a necessidade de equilibrar justiça, humanidade e pragmatismo em momentos de ruptura. A anistia no ES foi um acerto ao pacificar uma crise aguda. Para o 8 de janeiro, ela oferece uma chance de humanizar a resposta, individualizando condutas e separando culpados de inocentes, conforme a lei.
É um primeiro passo para um futuro menos polarizado, superando a percepção pública de justiçamento e linchamentos pelo STF (lawfare). A lição é clara: diante de crises, diálogo e sabedoria podem ser mais eficazes que a intransigência punitiva.
Em resumo, a anistia proposta para 08 de janeiro ecoa a experiência capixaba, buscando pacificação sem abrir mão da responsabilização dos culpados. É uma tentativa de virar a página, apostando na reconciliação rumo a uma nação menos dividida. Afinal, somos todos brasileiros, somos todos um país, somos todos humanidade.